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Artigos › 04/06/2022

A floresta queimada é a humanidade morta

Atento aos sinais dos tempos e comprometido com o cuidado da Casa Comum, o papa Francisco apresentou à Igreja, em 24 de maio de 2015, a Carta Encíclica Laudato Si’. Com este documento, o santo padre, chama a atenção de todas as pessoas para um tema importante e que não deve ser esquecido, isto é, o cuidado com a Criação. Na certeza de que toda a criação é “um projeto do amor de Deus, onde cada criatura tem um valor e um significado” (LS, nº 76) o bispo de Roma, seguindo os passos de seus predecessores, recolhendo também considerações do patriarca ecumênico Bartolomeu, faz ouvir o clamor da Terra, que “clama contra o mal que lhe provocamos por causa do uso irresponsável e do abuso dos bens que Deus nela colocou.” (LS, nº 7).
Depois, Francisco convocou um Sínodo Especial para a Amazônia, que se realizou em outubro de 2019, no intuito de olhar para essa região e para os diversos povos que nela habitam, isso se fez necessário, pois como diz o Documento Final do Sínodo: “A Amazônia hoje é uma beleza ferida e deformada, um lugar de dor e violência. Os ataques à natureza têm consequências para a vida dos povos”. O desejo do papa ao tocar nesse assunto e trazê-lo à tona é para “despertar a estima e a solicitude por esta terra, que também é ‘nossa’, convidando a admirá-la e reconhecê-la como um mistério sagrado” (QA, nº 5).
Agora, no último 29 de maio, Francisco anunciou um consistório, no qual criará novos cardeais. Entre os nomes está o de Dom Leonardo Steiner, Arcebispo de Manaus. Olhando rapidamente a lista dos nomes, percebe-se que o papa olha para as periferias de todo o mundo, o que não surpreende em Francisco, pois suas escolhas e olhares são sempre abrangentes e nunca exclui ninguém. Como o próprio Dom Leonardo disse, numa coletiva de imprensa, “A Amazônia não ficou esquecida pelo Papa”. Já na Querida Amazônia Francisco registrava: “E nos dias de hoje, a Igreja não pode estar menos comprometida, chamada como está a escutar os clamores dos povos amazônicos” (nº 19). Assim, como escreveu Elio Gaspari: “A nomeação de um cardeal para a floresta é um sinal para o garimpo ilegal e seu braço no crime organizado”.
Dando um cardeal à Amazônia, o papa olha mais uma vez, como olhou na Laudato Si’ e no Sínodo para a Amazônia, para as questões ecológicas e para as questões sociais que brotam desta, como elucida o número 08 da Exortação Apostólica Querida Amazônia: “Apesar do desastre ecológico que a Amazônia está enfrentando, deve-se notar que uma verdadeira abordagem ecológica sempre se torna uma abordagem social, que deve integrar a justiça nos debates sobre o meio ambiente, para ouvir tanto o clamor da terra como o clamor dos pobres. Não serve um conservacionismo que se preocupa com o bioma, porém ignora os povos amazônicos”. Encaixa-se nessa reflexão a frase de Milton Hatoum, romancista amazonense, em Cinzas dos Norte: “A floresta queimada é a humanidade morta”, pois a devastação é uma ameaça à dignidade humana, principalmente da população que vivem nessas regiões.
Neste 05 de junho, Dia Mundial do Meio Ambiente, queremos ouvir as palavras do papa Francisco, lavradas na mensagem para o 59º Dia Mundial de Oração pelas Vocações, na qual se lê: “somos chamados a ser guardiões uns dos outros, a construir laços de concórdia e partilha, a curar as feridas da criação para que não seja destruída a sua beleza”. O cuidado com a Criação é fruto de um compromisso, que brota da relação com Deus e com os irmãos. Cuidamos da Casa Comum, porque também ela nos revela Deus, cuidamos dela, ainda, porque queremos deixa-la habitável para as novas gerações. Cuidar da Casa Comum, olhando para os povos originários, é buscar reparar uma história de sofrimento e desprezo, fruto de interesses colonizadores, que massacram as minorias (indígenas, ribeirinhos e afrodescendentes).
Leonardo Henrique Agostinho, MSC

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